terça-feira, 22 de julho de 2008

Felizes para sempre

O filme Pão e Tulipas conta a história de uma dona-de-casa que viaja de
excursão com a família mas é esquecida pelo ônibus num restaurante de 
beira de estrada. Então ela aproveita a oportunidade para “tirar férias” 
da vida que levava: pega uma carona, vai pra Veneza e começa a 
excursionar sozinha por uma nova vida.

Ao sair do cinema, me lembrei de uma passagem do livro Ela é Carioca,
de Ruy Castro. Lá pelas tantas ele conta que determinada mulher havia 
viajado muito e freqüentado todas as festas, até que casou, teve três 
filhos e por pouco não se aquietou. “Se ela se distraísse, acabaria sendo 
feliz para sempre.”

Ser feliz para sempre é o final que todos nós sonhamos para nossa 
história pessoal. A personagem de Pão e Tulipas estava sendo feliz pra 
sempre, até que descobriu que a felicidade muda de significado várias 
vezes durante o percurso de uma vida. Ninguém sabe direito o que é 
felicidade, mas, definitivamente, não é acomodação. Acomodar-se é o 
mesmo que fazer uma longa viagem no piloto automático. 
Muito seguro, mas que aborrecimento.
É preciso um pouquinho de turbulência para a gente acordar e sentir 
alguma coisa, nem que seja medo.

Tem muita gente que se distrai e é feliz pra sempre, sem conhecer as
delícias de ser feliz por uns meses, depois infeliz por uns dias,
felicíssimo por uns instantes, em outros instantes achar que ficou 
maluco, então ser feliz de novo em fevereiro e março, e em abril 
questionar tudo o que se fez, aí em agosto, ser feliz porque uma ousadia 
deu certo, e infeliz porque durou pouco, e assim sentir-se realmente 
vivo, porque cada dia passa a ser um único dia, e não mais um dia.

Eu não gosto de montanha-russa, o brinquedo, mas gosto de 
montanha-russa, a vida. Isso porque creio possuir um certo grau de 
responsabilidade que me permite saber até que altura posso ir e que 
tipo de tombo posso levar sem me machucar demasiadamente: 
alto demais não vou, mas ficar no chão o tempo inteiro não fico.

Viver não é seguro. Viver não é fácil. E não pode ser monótono. Mesmo
fazendo escolhas aparentemente definitivas, ainda assim podemos 
excursionar por dentro de nós mesmos e descobrir lugares desabitados 
em que nunca colocamos os pés, nem mesmo em imaginação. 
E estando lá, rever nossas escolhas e recalcular a duração de 
“pra sempre”. Muitas vezes o “pra sempre”não dura tanto quanto 
duram nossa teimosia e receio em mudar.
(Martha Medeiros)

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