domingo, 25 de julho de 2010

O poder do perdão

"Para as ofensas, a maior arma é o esquecimento. É no esquecimento que se igualam vingança e perdão." Jorge Luís Borges, sobre Jó, o mais fervoroso protagonista do Velho Testamento

Assumir um erro, repudiá-lo e demonstrar arrependimento, de um lado, e ser capaz de afastar a sensação de injustiça causada por uma ofensa, do outro – eis a equação de uma das atitudes morais mais nobres e emocionalmente complexas já criadas pela civilização ocidental.

Perdoar é coisa nova – o moderno conceito de perdão, com reconhecimento de culpa, arrependimento e disposição do ofendido para absolver o ofensor, marca o ápice das conquistas éticas da civilização ocidental.


Tribos africanas
Os igbos da Nigéria e os oromos da Etiópia creem que a paz só pode ser alcançada através do perdão, para o qual não é necessário o arrependimento do agressor.



Antiguidade clássica
Os gregos e os romanos não assumiam a culpa por seus erros, sempre atribuídos ao capricho dos deuses. Na tragédia Édipo Rei de Sófocles, o personagem mata o pai, casa-se com a mãe e se arrepende, mas não existe perdão, pois Édipo agiu às cegas.



Budismo
A filosofia fundada quatro séculos antes de Cristo repudia os conceitos de pecado e culpa. A raiva e o ressentimento são ilusões, que devem ser dissipadas através da meditação.



Velho Testamento
José enriquece (Gênesis, cap. 50) e seus irmãos, que o haviam vendido como escravo no Egito, pedem perdão, mas sem rever sua culpa e apenas para escapar às punições.



Novo Testamento
Jesus nos Evangelhos, manda perdoar e pedir perdão a Deus, que arbitra se concede ou não essa dádiva.



Islamismo
A reconciliação é desejável, mas não necessária. Quem perdoa o outro o faz para obter, depois, o próprio perdão por seus pecados junto a Alá.
Idade Média
No século VI, os povos germânicos seguiam diversos cânones, combinação de antigos ensinamentos teutônicos, com códigos romanos e cristianismo. O perdão aos hereges também exigia sua conversão.

Na era medieval, o sofrimento voluntário pela mendicância ou autoflagelação parecia ser o único caminho para obter o perdão divino.

Na vida secular, dívidas e ofensas podiam ser perdoadas, mas isso não incluía o arrependimento. se alguém ferido gravemente sobrevivesse por "um ano mais um dia", o agressor era automaticamente perdoado.

A Reforma Protestante nasceu, em parte, da revolta com a comercialização das indulgências, uma espécie de perdão, vendida pelos bispos e pelos papas.

No apagar das luzes da Idade Média, a Lei Sálica predominava no que é hoje a Europa Ocidental. Seus códigos mandavam perdoar hereges arrependidos desde que se convertessem ao cristianismo.

Civilizações Pré-Colombianas
No s éculo XV, uma leis asteca permitia que uma pessoa confessasse um crime e saísse impune. Mas isso só poderia acontecer uma vez. O objetivo era dar uma segunda chance aos arrependidos.

Os maias (século III a IX) possuíam um ritual de perdão coletivo. Em meio a cantorias e danças, as pessoas arrependidas se ajoelhavam diante da outra, de pé.

Iluminismo
O sentido moderno do perdão se materializaria nas reflexões éticas do filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804), que transferiu do plano divino para o humano a virtude do perdão.




















































Fonte: trechos do texto de Ana Claudia Fonseca da Revista Veja edição 2175 - nº 30 - ano 43 - 28 julho 2010

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