domingo, 15 de agosto de 2010

General Verão

Uma onda de calor, capaz de deixar os habitantes dos trópicos esbaforidos, abateu-se sobre a Rússia nos últimos dois meses. Os termômetros marcaram 39 graus no centro de Moscou durante dois dias seguidos. A temperatura mais alta já registrada na capital russa fora de 37,2 graus, em agosto de 1920. Este é o verão mais quente, desde que se iniciaram os registros metereológicos, em 1880. Historicamente, o verão em Moscou é ameno. Em julho, o mês mais quente, a média é de 23 graus, em agosto caindo para 20 graus.

A fumaça dos incêndios florestais tornou irrespirável o ar de Moscou. Parte da população só sai à rua com máscaras cirúrgicas. As autoridades estimam que apenas na capital 5 000 pessoas morreram em decorrência do calor. Entre o inverno e o verão de 2010, os moscovitas foram submetidos a uma diferença térmica de 65 graus.
  • a Rússia é o 3º maior poluidor mundial
  • o número de dias extremamente quentes triplicou nos últimos 130 anos

Também as chuvas desse ano, as mais intensas desde 1929, causaram inundações que desabrigaram 6 milhões de pessoas. De acordo com a NOAA (Administração Nacional para Oceanos e Atmosferas dos EUA), 16 países registraram temperaturas acima da média histórica neste ano. Em maio, 53,5 graus no Paquistão. O mês de junho foi o mais quente no Hemisfério Norte desde o século XIX.


O mito do General Inverno
Em um dos monumentos literários,
Guerra e Paz, Leon Tolstoi narra a desastrosa invasão da Rússia por Napoleão Bonaparte, em 1812. Na versão do escritor russo, disseminada nos livros escolares, os principais responsáveis pela derrocada da grande armée foram o patriotismo dos russos e o rigoroso inverno de seu país. Dominic Lieven, professor de história, decidiu arcar com o ônus de contestar a versão de Tolstoi. Na mais de 600 páginas de seu recém-lançado livro 'A verdadeira história das campanhas de Guerra e Paz: a Rússia contra Napoleão' , Lieven se esmera para desatar um equívoco histórico resultante da simplificação dos fatos. A Rússia venceu o Exército de Napoleão, porque o czar Alexandre I se antecipou à guerra, estudou o inimigo e suas fraquezas e tinha uma estratégia militar superior. A participacão do General Inverno, como se tornou conhecido o frio arrebatador da Rússia, foi secundária. Napoleão então senhor de toda a Europa Ocidental, marchou para a Rússia com meio milhão de soldados. Com um número muito menor de homens, Alexandre I se viu diante da necessidade de evitar as batalhas decisivas. Em setembro, Napoleão tomou Moscou e enviou ao czar uma proposta de paz, certo de que ele não teria alternativa senão aceitá-la. Os russos protelaram a decisão com o intuito de manter Napoleão em Moscou o maior tempo possível, fustigando suas tropas com escaramuças. A estratégia era vencer o inimigo pela exaustão, cortando seus suprimentos e abatendo o moral da tropa. Em outubro, os franceses, sem comida e doentes, se viram diante de uma nova ameaça: o frio. Com a chegada do inverno, bateram em retirada, mas a maioria dos soldados ficou no meio do caminho. Do meio milhão de homens de Napoleão, apenas 6 000 voltaram para casa. Assim como a França napoleônica, a Alemanha nazista foi derrotada na Rússia por uma conjunção de fatores, como a vastidão do território russo e dificuldade em abastecer as tropas. Mais uma vez, o General Inverno atuou, mas apenas como coadjuvante.



Fonte: revista Veja - nº 33 - 18 agosto 2010

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